Falhas em mutações dão origem ao câncer, diz pesquisa
Duas de cada três mutações genéticas responsáveis pelo câncer resultam de erros aleatórios que ocorrem no momento em que as células se dividem, um processo essencial para a regeneração do organismo, segundo um estudo americano publicado na quinta-feira (23), na edição semanal da revista especializada Science. Não são resultado de uma vida pouco saudável ou de genes defeituosos legados por pais e avós, mas de pura falta de sorte.
A conclusão pode parecer fatalista, mas foi formulada a partir de dados sólidos sobre a incidência de 32 tipos de câncer, assim como uma amostra da população e dados epidemiológicos mais amplos, provenientes de 69 países e que representam 4,8 bilhões de pessoas.
Os tumores
O fator sorte também varia segundo os tipos de tumores, determinou o estudo. Assim, 77% dos casos de câncer de pâncreas são resultado de erros aleatórios do DNA na divisão celular, enquanto 18% se devem a outros fatores, como o tabaco ou o álcool, e 5% à hereditariedade. Já no caso dos cânceres de próstata, de cérebro e de osso, 95% seriam resultado da má sorte na divisão celular.
Em relação ao câncer de pulmão, 65% dos casos são desencadeados pelo fumo e 35% por erros na replicação do DNA. “Está amplamente comprovado que evitar certos fatores como o tabaco ou a obesidade reduz o risco de câncer”, aponta Cristian Tomasetti, professor adjunto de bioestatística do Centro do Câncer da Universidade Johns Hopkins e um dos autores da pesquisa. “Mas cada vez que uma célula normal se divide e replica seu DNA para produzir duas novas células, comete vários erros, um aspecto ignorado cientificamente durante muito tempo”, explicou.
No total, “66% das mutações cancerosas resultam de erros quando as células se dividem, enquanto 29% se devem a fatores ambientais e ao estilo de vida, e 5% à hereditariedade”, especificou o médico Bert Vogelstein, codiretor do estudo.
Método e letras
O estudo foi baseado em um modelo matemático e análises genômicas para tentar estimar com mais precisão o papel relativo das três grandes variáveis associadas ao surgimento do câncer, designadas em inglês pelas letras E (de “environment”, ou ambiente), H (hereditariedade) e R (replicação errada do DNA por motivos randômicos ou aleatórios -a tal má sorte).
Quanto à letra H, sabe-se há décadas que os descendentes de certas famílias correm risco aumentado de desenvolver câncer por conta de mutações que afetaram o genoma de um ancestral e foram sendo transmitidas para seus rebentos -nenhum mistério até aí.
Mas, faltava o R. A questão apontada pelo grupo dos EUA é a seguinte: embora o organismo humano seja uma máquina biológica fantástica, ele não é perfeito. Toda vez que uma célula se divide, dando origem a duas células-filhas, ela precisa produzir uma nova cópia de todo o seu DNA. As pequenas ineficiências do procedimento acabam levando a errinhos de cópia nas “letras” químicas do genoma.
Via FolhaPE